terça-feira, 27 de setembro de 2011

DOENÇA MENTAL GERA ESTABILIDADE NO EMPREGO?


Prezados leitores.

Quando o assunto é estabilidade no emprego em virtude de doença, logo nos vem à memória a redação do Art. 118 da Lei 8.213 / 1991:

“O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente da percepção de auxílio-acidente.”

Conforme nos ensina o Artigo 20 da mesma lei, o acidente do trabalho equipara-se à doença ocupacional. Sendo assim, o empregado acometido por alguma doença relacionada ao trabalho também tem a prerrogativa do gozo da estabilidade mínima de 12 meses, após cessação de seu auxílio-doença acidentário. É o que nos confirma também o inciso II da Súmula 378 do TST:

São pressupostos para a concessão da estabilidade o afastamento superior a 15 dias e a conseqüente percepção do auxílio doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida, doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego.” (grifo nosso)

E quando a doença não é ocupacional: terá o empregado direito à alguma estabilidade quando de sua dispensa do trabalho?

A dispensa arbitrária (sem justa causa), é permitida em nossa legislação, baseado no princípio fundamental do empregador, estabelecido pela própria Constituição Federal de 1988 (CF/88), da livre iniciativa, e do exercício do seu poder potestativo (poder que o empregador tem de “escolher com quem quer trabalhar”).

Mas, se por um lado a CF/88 dá ao empregador a possibilidade deste contratar (e descontratar) quem quiser, e quando quiser; a mesma CF/88 dá garantias fundamentais à cada cidadão brasileiro, tais como: preservação da intimidade, da liberdade de expressão, da igualdade, da dignidade da pessoa humana, etc.

E quando a CF/88 for contrária à própria CF/88? Ou seja, e quando o poder potestativo do empregador (de contratar e descontratar quem quiser, e quando quiser) ofender à alguma garantia fundamental do cidadão, como por exemplo, à preservação da igualdade, ou da dignidade da pessoa humana?

Vejamos alguns exemplos desses casos:

>> suponhamos um excelente professor de uma escola de ensino médio. Nas horas vagas, este professor escreve poesias eróticas e alimenta um blog pessoal com tais poesias. A escola poderia dispensá-lo do emprego por esse motivo, ou haveria aí uma afronta à garantia fundamental da liberdade de expressão desse professor?

>> um empregado é HIV positivo. Ao revelar isso na empresa, esse empregado é dispensado do trabalho. Houve lesão à preservação da igualdade estabelecida na CF/88?

>> um trabalhador é dispensado em virtude de uma doença crônica não ocupacional (por exemplo, câncer). Há lesão ao princípio fundamental da dignidade da pessoa humana?

Todos os exemplos citados confrontam os direitos fundamentais e constitucionais do empregador e do empregado. Qual deve prevalecer? O juiz decidirá.

Mas então: doença não ocupacional também gera estabilidade? Resposta: pode gerar. Senão vejamos os seguintes julgados:

a)  processo: 0000467-07.2010.5.04.0611. Nesse caso, o empregador dispensou (sem justa causa) um empregado HIV positivo (cuja contaminação não tinha nenhuma relação com o trabalho), pouco mais de uma semana após ter ciência do diagnóstico do trabalhador. Como a contaminação com o vírus HIV não foi em virtude do trabalho, teoricamente esse empregado não gozava de estabilidade. Resultado: o empregador foi condenado a indenizar o trabalhador em R$ 8.000,00 por danos morais em virtude da afronta à garantia constitucional da igualdade;

b)  processo: 810404-10.2001.5.12.5555. Aqui, o empregado comunicou à empresa que faria uma cirurgia de hérnia inguinal (nesse caso, considerada doença não ocupacional), e que depois teria que ficar afastado para se recuperar da cirurgia por alguns dias. Após o comunicado, e antes que a cirurgia ocorresse, o empregador dispensa o empregado (sem justa causa), uma vez que esse empregado não gozava de estabilidade. Resultado: a empresa foi condenada a pagar o valor de R$ 20.000,00 por danos morais em virtude da afronta ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, mesmo diante de uma doença não relacionada ao trabalho;

c)  processo 165140-46.2006.5.01.0027. Nesse exemplo, após cessação do auxílio-doença do INSS, um empregado portador de cirrose (considerada como doença não ocupacional) foi dispensado do emprego, pois foi considerado "apto" e legalmente não gozava de estabilidade. Resultado: a empresa foi obrigada a reintegrá-lo;

d) processo 49/2006-046-02-40.7. Nesse caso, o empregador dispensou um empregado acometido por câncer (nesse caso, considerada uma doença não ocupacional). O Tribunal Superior do Trabalho (TST) foi enfático: o trabalhador comprovadamente portador de doença grave não pode ter seu contrato rompido, esteja ou não afastado previdenciariamente do serviço, uma vez que a manutenção da atividade laborativa, em certos casos, é parte integrante do próprio tratamento médico”. Além disso, o TST qualificou a atitude da empresa como discriminatória. Resultado: o empregado foi reintegrado ao trabalho.

e) processo RR - 105500-32.2008.5.04.0101. Aqui, a empresa Walmart teve de reintegrar ao emprego um ex-funcionário, portador de esquizofrenia (doença não ocupacional), dispensado sem justa causa logo após ter ficado afastado do trabalho, pelo INSS, para tratamento médico. A decisão, que considerou a dispensa arbitrária e discriminatória (pois se deu após a empresa ter ciência de que o empregado possuia enfermidade ligada ao uso de drogas), prevaleceu em todas as instâncias judiciais trabalhistas, inclusive no TST. 

f) processo AIRR-12635-31.2010.5.04.0000. Nesse caso, verificaremos um caso que se contrapõe frontalmente ao exemplo anterior, o que mostra que não temos posicionamentos pacificados nos tribunais no que se refere à essa matéria. Vejamos: uma ex-diretora da Fundação de Atendimento Sócio-Educativo do Rio Grande do Sul (Fase), portadora de transtorno afetivo bipolar foi dispensada do emprego. Por ter gozado de auxílio-doença (não acidentário), ajuizou uma ação trabalhista alegando que sua doença era ocupacional, e que sua dispensa da empresa caracterizava uma atitude discriminatória, pedindo assim indenização. A perícia médica judicial concluiu pela ausência do nexo de (con)causalidade entre o transtorno afetivo bipolar e o trabalho da ex-diretora. O ministro Horácio de Senna Pires, do TST, não reconheceu a existência de doença ocupacional que justificasse a indenização, “embora a doença a tornasse incapaz para o trabalho”. Entendeu, ainda, que a dispensa não foi discriminatória, e absolveu a fundação.

Por todo exposto, enquanto permanecer a discórdia de entendimentos entre os julgadores no que tange a esse assunto, devemos considerar que, independente de serem (ou não) doenças ocupacionais, as doenças crônicas consideradas graves podem garantir ao trabalhador estabilidade no emprego, apesar de não haver lei em vigor que imponha isso de forma específica.

Conclusão: é dado constitucionalmente ao empregador o poder potestativo, ou seja, o poder de contratar e descontratar quem quiser, e quando quiser.   No entanto, se ao dispensar algum empregado (sem justa causa), houver questionamento judicial de que houve lesão de alguma garantia fundamental do cidadão estabelecida na mesma CF/88 (ex.: intimidade, liberdade de expressão, igualdade, dignidade, etc.), a reintegração ao emprego (e alguma indenização) poderá ser pleiteada.

Um forte abraço a todos.

Que Deus nos abençoe.

Marcos H. Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha

domingo, 25 de setembro de 2011

CFM x COFFITO x MINHA OPINIÃO

Prezados leitores.

O Conselho Federal de Medicina (CFM) impetrou ação em face do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO), no Tribunal Regional da Primeira Região (TRF1), pedindo nulidade dos Artigos 1, 2, 3 e 4 da Resolução COFFITO n. 381 / 2010, no sentido de que os inscritos do COFFITO se abstenham de emitir qualquer laudo, parecer ou atestado de saúde.  Os artigos atacados por essa ação estão transcritos abaixo:

“Artigo 1º: O Fisioterapeuta no âmbito da sua atuação profissional é competente para elaborar e emitir parecer, atestado ou laudo pericial indicando o grau de capacidade ou incapacidade funcional, com vistas a apontar competências ou incompetências laborais (transitórias ou definitivas), mudanças ou adaptações nas funcionalidades (transitórias ou definitivas) e seus efeitos no desempenho laboral em razão das seguintes solicitações:
a) demanda judicial;
b) readaptação no ambiente de trabalho;
c) afastamento do ambiente de trabalho para a eficácia do tratamento fisioterapêutico;
d) instrução de pedido administrativo ou judicial de aposentadoria por invalidez (incompetência laboral definitiva);
e) instrução de processos administrativos ou sindicâncias no setor público (em conformidade com a Lei 9.784/99) ou no setor privado e
f) e onde mais se fizerem necessários os instrumentos referidos neste artigo.

Artigo 2º: Atestado trata-se de documento qualificado, afirmando a veracidade sobre as condições do paciente, declarando, certificando o grau de capacidade ou incapacidade funcional com vistas a apontar as competências ou incompetências (transitórias ou definitivas), habilidades ou inabilidades do cliente em acompanhamento terapêutico.

Artigo 3º: Parecer trata-se de documento contendo opinião do fisioterapeuta acompanhada de documento firmado por este sobre determinada situação que exija conhecimentos técnicos/científicos no âmbito de sua atuação profissional decorrente de controvérsia submetida a alguma espécie de demanda, que não trata necessariamente de um indivíduo em especial. Portanto, significa emitir opinião, fundamentada, sobre aspectos gerais ou específicos da respectiva disciplina (Fisioterapia) em face do grau de capacidade ou incapacidade funcional, com vistas a apontar competências ou incompetências (transitórias ou definitivas), mudanças ou adaptações nas funcionalidades (transitórias ou definitivas) e seus efeitos no desempenho laboral objeto desta Resolução.

Artigo 4º: Laudo Pericial trata-se de documento contendo opinião/parecer técnico em resposta a uma consulta, decorrente de controvérsia submetida a alguma espécie de demanda. É um documento redigido de forma clara, objetiva, fundamentado e conclusivo.”

Por sua vez, o juiz federal, MM. Dr. Novély Vilanova da Silva Reis, indeferiu a antecipação dos efeitos da tutela requerida pelo CFM “porque não existe probabilidade de procedência da causa” (confira o inteiro teor da decisão proferida através do link: http://bit.ly/nqq631 ).

O CFM entrou com recurso (agravo de instrumento) contra a decisão do juiz, cujo resultado ainda não tenho conhecimento em 25/09/2011.

Pois bem, com relação à atestados e pareceres emitidos por fisioterapuetas e outros profissionais não médicos, minha opinião pode ser verificada pelo link: http://bit.ly/nfAvUi ).

Com relação à participação de fisioterapeutas e outros profissionais não médicos como peritos judiciais, eis o que penso. Assim nos traz o Artigo 145 do Código de Processo Civil (CPC):

“Art. 145 - Quando a prova do fato depender de conhecimento técnico ou científico, o juiz será assistido por perito, segundo o disposto no Art. 421.

§ - Os peritos serão escolhidos entre profissionais de nível universitário, devidamente inscritos no órgão de classe competente, respeitado o disposto no  Livro I, Título VIII, Capítulo VI, Seção VII, deste Código.

§ - Os peritos comprovarão sua especialidade na matéria sobre que deverão opinar, mediante certidão do órgão profissional em que estiverem inscritos.

§ - Nas localidades onde não houver profissionais qualificados que preencham os requisitos dos parágrafos anteriores, a indicação dos peritos será de livre escolha do juiz.”

O que tenho observado na prática pericial, especialmente na Justiça do Trabalho, é uma grande dificuldade dos magistrados em conseguir médicos para atuarem como peritos. Na minha opinião, os baixos honorários pagos aliados à demora no recebimento são os principais fatores relacionados à falta de médicos no campo pericial. Da forma como as coisas estão estruturadas na Justiça do Trabalho, o desestímulo é evidente.

Mas alguém já disse: “ema, ema, ema... cada um com seu problema”. Se os médicos de forma legítima abrem mão do ofício pericial em virtude da baixa remuneração, a Justiça não pode parar por causa disso. Em regra, os magistrados são sensíveis aos baixos valores pagos pelas atividades periciais (a todos os profissionais que a executam), ao mesmo tempo em que não possuem autonomia legislativa e orçamentária para mudar esse cenário. Aplica-se então, uma adequação do “princípio da reserva do possível” no que tange ao pagamento dos honorários periciais.

Nesse contexto, ganha imensa força o § 3º do Artigo 145 do CPC: “nas localidades onde não houver profissionais qualificados que preencham os requisitos dos parágrafos anteriores, a indicação dos peritos será de livre escolha do juiz”. Ou seja, se um profissional (qualquer um) não aceitar o encargo pericial, outro profissional (qualquer um) poderá ser indicado mediante livre escolha do juiz.  

Nunca nos esqueçamos do objetivo mor de um laudo pericial: auxiliar o juiz. Portanto, o magistrado a ser auxiliado tem o poder discricionário de escolher quem bem entender para auxiliá-lo, com fulcro no já citado § 3º do Artigo 145 do CPC. Na falta de peritos que atuem, muito acima dos protecionismos de mercado está a legalmente respaldada escolha do juiz.

Já com relação à participação de fisioterapeutas e outros profissionais não médicos como assistentes técnicos em “perícias médicas”, minha opinião pode ser verificada pelo link: http://bit.ly/pzBhhv ).

Sintam-se à vontade para emissão de opiniões (concordantes ou contrárias): “que briguem as idéias, jamais os homens”.

Um forte abraço a todos e até terça-feira (27/09), data provável para postagem de um novo texto nesse blog.

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

MÉDICOS: MOCINHOS OU VILÕES?

Prezados leitores.

É de conhecimento de todos que ontém, 21 de setembro de 2011, ocorreu um justo movimento médico nacional contra os baixos honorários e a intervenção na autonomia dos médicos praticada por parte das operadoras e planos de saúde.

Como o objetivo desse blog é incentivar a boa reflexão sobre temas diversos ligados à área médica, aproveito a oportunidade dessa data para transcrever o excelente texto de autoria da Professora Dra. Isabella Vasconcellos de Oliveira, que chegou ao meu e-mail.

Um forte abraço a todos até a próxima terça-feira (27/09), data provável para postagem de um novo texto nesse blog.

Que Deus nos abençoe.

Boa leitura!


Médicos, Operadoras  e eu

Hoje, 21 de setembro de 2011, meus colegas médicos brasileiros que atuam como prestadores para operadoras de saúde suplementar participaram de uma paralisação nacional em defesa de seus honorários. Defendem uma remuneração mais justa, de R$ 60,00 pela consulta, o que, comparado a serviços prestados por outros profissionais, realmente não é muito.

Concordo que as tabelas de remuneração estão defasadas e admiro quem luta pela valorização do trabalho médico. Entretanto, da forma como a mídia anuncia o fato à população, as operadoras ficam parecendo as vilãs da história, enquanto que a classe médica ocupa a posição de vítima.

Nós que estamos dentro do sistema, sabemos que as coisas não são tão simples assim. Só quem acompanha o dia-a-dia de uma operadora de saúde suplementar, constata que a responsabilidade pela atual relação entre OPs e médicos é de todos e que a situação não é assim tão claramente fragmentada.

Venho repetindo ad nauseam que a principal responsável pela inflação da saúde é a classe médica. É a caneta do médico que solicita exames desnecessários, indica cirurgias quando o tratamento padrão é o conservador, pede próteses de marcas e medicamentos de alto custo dos quais recebe participações financeiras e atualmente até indica advogados a pacientes para que eles entrem com liminares, quando seus planos de saúde negam algum procedimento. Não estou dizendo que todos os médicos agem desse modo, sabemos que é uma minoria. Mas temos que parar de fingir que essas coisas não acontecem.

E claro que também sabemos por outro lado que existem OPs que praticam glosas lineares, ferem contratos e interferem na conduta médica. Mas o que é exatamente interferir na conduta médica? É querer conversar com o colega quando ele solicita algo que nós, como auditores médicos consideramos sem evidencias ou desnecessário? Por que somente nós auditores temos que nos preocupar com o custo da saúde? Isso não deveria ser uma obrigação de todos?

Hoje, durante a tarde, indeferi uma solicitação de uma colega obstetra que pedia uma internação de véspera para uma cesárea numa gestante portadora de estreptococo do grupo B. Sua conduta médica estava corretíssima: pretendia fazer a profilaxia da infecção do recém nato pela bactéria presente na mãe com um antibiótico venoso. O problema: a operadora teria que pagar uma diária a mais por isso. Como a profilaxia é feita 4 horas antes do parto / cesárea, não vi justificativa para internação de véspera. Caso a paciente internasse às 7 da manhã, poderia ser operada na parte da tarde com toda a segurança. Diante da negativa, a colega médica entrou em contato comigo para tentar justificar sua solicitação. Havia agendado a cesárea eletiva para às 9 da manhã e então precisava que a gestante internasse na véspera. Então pedi que ela remarcasse a cirurgia para mais tarde, pois isso não justificava uma internação na véspera e ela argumentou que tinha consultório à tarde e não queria desmarcá-lo. Quando eu, educadamente disse que isso não era argumento que justificasse um incremento de custo para a operadora, a colega se enfureceu e disse: "Isso é um abuso. Você, como minha colega médica deveria entender que tenho meus compromissos". Pois bem, na cabeça da minha colega, os "seus compromissos" justificam a transferência do ônus para a operadora, e conseqüentemente para toda a carteira da empresa da paciente. Ela se acha coberta de razão e certamente engrossará a fila dos que dizem que as Ops interferem na conduta dos médicos.

Estou cansada de ouvir dos meus colegas que eles não têm que se preocupar com custo, mas sim com o paciente, pois precisam oferecer a ele o melhor atendimento possível. Correto. Mas e nós auditores de OPs, não estamos preocupados com os nossos beneficiários? Temos uma preocupação muito mais complexa que vai da saúde do paciente / indivíduo à saúde de todos os beneficiários de uma carteira. Pois quando um colega indica um procedimento desnecessário, são todos os beneficiários daquela carteira que pagam por ele (é o princípio do mutualismo). Quando será que a classe médica se conscientizará disso?

Para finalizar este belo dia, ouço no Jornal nacional que o TCU auditou os hospitais federais no RJ e encontrou um rombo de 16 milhões de reais por desvios de verba. E o Governo querendo nos impingir um novo imposto para financiar o rombo da saúde pública.

Algo está errado com o mundo ou estarei ficando louca?

Abraço a todos,

Dra. Isabella Vasconcellos de Oliveira
Docente do tema “Avaliação de Tecnologia em Saúde” da Rede LFG de Ensino
Auditora Médica da CAREPLUS 

MEU PACIENTE DIZ QUE EMPRESA EXIGE CID NO ATESTADO. O QUE FAÇO?

Vídeo-aula sobre esse texto:



Prezados leitores.

Eis a pergunta que veio através do meu e-mail:

“Marcos.
(...)
Tenho uma clínica de Medicina do Trabalho em XXXX. Uma empresa local não aceita atestados médicos que eu emito, a não ser que tenha CID. Sei que não sou obrigado a colocar CID, conforme regras do CRM, mas acabo colocando assim mesmo. Há alguma sugestão nesse caso?
(...)
Dr. XXXX”

Primeiramente, cabe uma outra pergunta: por quê uma empresa recusaria um atestado médico emitido pelo ortopedista de um de seus empregados? Só conseguimos ver uma resposta que seja eticamente e moralmente aceitável: por desconfiança quanto à verdadeira necessidade dos dias propostos para afastamento nesse atestado. Considerando que os chamados “atestados graciosos” (atestados que sugerem um número de dias de afastamento maior do que o necessário) existem em abundância, torna-se compreensível a contínua desconfiança das empresas quanto aos atestados trazidos por seus empregados.

Por uma questão lógica, podemos afirmar que somente os profissionais do serviço médico da empresa possuem o gabarito técnico e científico de, eventualmente, confrontar os atestados emitidos por outros médicos que assistam os empregados. O chefe do departamento de recursos humanos (RH), por exemplo, normalmente não possui conhecimento técnico para avaliar os atestados trazidos pelos trabalhadores. Assim, como regra, concluímos que a empresa, sem o seu serviço médico, não deveria negar a eficácia de nenhum atestado trazido por seus empregados. Não deveria, mas existem várias empresas que compartilham dessa prática.

Ratificando, somente as empresas que dispuserem de serviço médico, possuem a condição técnica de avaliar um trabalhador (através de um novo exame clínico), no sentido de certificar a veracidade e coerência do atestado trazido. Corrobora com esse raciocínio a Lei n. 8.213 / 91, em seu art. 60, § 4º:

“A empresa que dispuser de serviço médico, próprio ou em convênio, terá a seu cargo o exame médico e o abono das faltas correspondentes ao período referido no § 3º (aos 15 primeiros dias de afastamento — grifo nosso) somente devendo encaminhar o segurado à perícia médica da Previdência Social quando a incapacidade ultrapassar 15 dias.”

Sobre a postura do serviço médico da empresa frente aos atestados trazidos por seus funcionários, advogamos com veemência a tese de que não basta que esse serviço “homologue” (ou não) os atestados trazidos, simplesmente aceitando-os ou negando-os. A avaliação documental do atestado trazido pelo empregado é importante. No entanto, muito (mas muito) mais importante é a realização de um novo exame clínico nesse trabalhador, feito pelo próprio serviço médico da empresa. É esse novo exame clínico que mostrará a coerência (ou não) do atestado trazido pelo empregado, tornando mais justa (e segura) sua avaliação. Assim, sugerimos sempre que o serviço médico da empresa só recuse (ou não) algum atestado trazido pelo trabalhador após um novo e detalhado exame clínico. Exploramos fartamente esse tema em outro texto desse blog, link: http://bit.ly/qQX66w


  Qual a justificativa legal para o médico da empresa poder recusar um atestado emitido por um outro médico?  Antes de respondermos a essa pergunta, faz-se necessário algumas considerações sobre a legalidade dos atestados para fins de abonos de faltas ao trabalho.

O enunciado da Lei 605 / 49, art. 6o, parágrafo 2o, assim coloca:

“A doença será comprovada mediante atestado de médico da instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado, e, na falta deste e sucessivamente, de médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria; de médico da empresa ou por ela designado; de médico a serviço de representação federal, estadual ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública; ou não existindo estes, na localidade em que trabalhar, de médico de sua escolha.”

  Na mesma linha, vem a Súmula n. 15 do Tribunal Superior do Trabalho:

“A justificação da ausência do empregado motivada por doença, para a percepção do salário-enfermidade e da remuneração do repouso semanal, deve observar a ordem preferencial dos atestados médicos, estabelecida em lei."

Complementando, vejamos o que diz a Lei 5.081 / 66, em seu art. 6, inciso III:

"Compete ao cirurgião dentista: atestar, no setor de sua atividade profissional, estados mórbidos e outros, inclusive para justificação de faltas ao emprego."  

Pelo exposto, observamos que, pela Lei 605 / 49, combinada com a Lei 5.081 / 66, somente médicos e odontólogos podem emitir atestados para fins de abonos de faltas ao trabalho. Percebemos também que essas leis não citaram nenhuma outra profissão. Nenhuma.

Importante salientar que essas leis são válidas apenas para trabalhadores vinculados a empresas privadas, ou para servidores públicos regidos pela CLT, conforme estabelece o art. 1 da Lei 605 / 49; e o já citado artigo 6, inciso III, da Lei 5.081 / 66, ao usar o termo “emprego” – palavra atribuída a uma relação trabalho balizada pela CLT. O Direito Público, em regra, tem suas próprias regras (estatutos).

Pela a análise do art. 6o, parágrafo 2o, da Lei 605 / 49, percebemos também uma clara hierarquia entre os atestados médicos para fins de abonos de faltas ao trabalho. A palavra “sucessivamente” não deixa nenhuma margem de dúvida quanto a isso. Conforme essa hierarquia, assim são valorados os atestados médicos:

·  1o lugar: atestado de médico da instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado;

·  2o lugar: atestado de médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria;

·  3o lugar: atestado de médico da empresa ou por ela designado (incluindo aqui a figura do "Médico Examinador", nos termos do item 7.3.2 da Norma Regulamentadora n. 7 do Ministério do Trabalho e Emprego);

·  4o lugar: atestado de médico a serviço de representação federal, estadual ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública;

·  5o lugar (e último): qualquer outro médico que o trabalhador escolher.

Na mesma esteira, assim julgou o Tribunal Superior do Trabalho (RR- 18-84.2010.5.12.0010):

EMENTA: “RECURSO DE REVISTA. SUMARÍSSIMO. ABONO DE FALTAS - ATESTADO FORNECIDO POR MÉDICO SEM VINCULAÇÃO COM A EMPRESA. A justificação da ausência do empregado motivada por doença, para a percepção do salário-enfermidade e da remuneração do repouso semanal, deve observar a ordem preferencial dos atestados médicos estabelecida em lei (Súmula/TST nº 15). Ao serviço médico da empresa ou ao mantido por esta última mediante convênio compete abonar os primeiros 15 (quinze) dias de ausência ao trabalho (Súmula/TST nº 282). Recurso de revista conhecido e provido.”

No entanto, pelo ensinamento trazido pela Lei 5.081 / 66, em seu art. 6, inciso III, entendemos que o art. 6o, parágrafo 2o, da Lei 605 / 49 pode ser também interpretado usando como equivalentes as palavras “médico” e “odontólogo”, únicos profissionais outorgados, mediante leis ordinárias, para emissão de atestados para fins de abonos de faltas ao trabalho. Assim, legalmente, consideramos correta (e completa) a seguinte hierarquia de atestados:

·  1o lugar: atestado de médico / odontólogo da instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado;

·  2o lugar: atestado de médico / odontólogo do Serviço Social do Comércio ou da Indústria;

·  3o lugar: atestado de médico / odontólogo da empresa ou por ela designado (incluindo aqui a figura do "Médico Examinador", nos termos do item 7.3.2 da Norma Regulamentadora n. 7 do Ministério do Trabalho e Emprego);

·  4o lugar: atestado de médico / odontólogo a serviço de representação federal, estadual ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública;

·  5o lugar (e último): qualquer outro médico / odontólogo que o trabalhador escolher.

Dessa forma, concluímos, por exemplo, que a decisão do Médico Perito do INSS (1o lugar na hierarquia) prevalece sobre a decisão do Médico do Trabalho / "Médico Examinador" (3o lugar na hierarquia). Abordamos com mais profundidade em outro texto desse blog, link: http://bit.ly/qQX66w

De maneira análoga, observamos que a decisão do Médico do Trabalho / "Médico Examinador" (3o lugar na hierarquia), prevalece sobre a decisão do Médico Assistente, escolhido livremente pelo paciente (5o lugar – e último – na hierarquia). Essa é a justificativa legal para o médico da empresa poder recusar um atestado emitido por um outro médico.

Exemplificando: caso o empregado leve algum atestado ao serviço médico da empresa, após a realização do exame clínico, o Médico do Trabalho / "Médico Examinador" (ou odontólogo da empresa, caso haja, para avaliação de assuntos relacionados à odontologia) poderá discordar daquele tempo proposto no atestado inicial, só devendo encaminhar o segurado à perícia médica da Previdência Social quando a incapacidade ultrapassar 15 dias contínuos (conforme art. 274 da Instrução Normativa INSS n. 45 / 10), ou intercalados (nos moldes estabelecidos pelo art. 276, incisos III e IV, da Instrução Normativa INSS n. 45 / 10). O parecer advindo desse novo exame clínico feito pelo serviço médico da empresa terá força legal de um novo atestado, dessa vez emitido pelo Médico do Trabalho / "Médico Examinador" (3o lugar na hierarquia). Assim, o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” poderá concordar (ou não) com o atestado trazido pelo empregado (independente da presença do CID), pois sua convicção se sustentará no exame clínico realizado por ele próprio, e não apenas no atestado em posse do trabalhador.

Na mesma esteira, vem o Parecer 3.657 / 2009 do Conselho Regional de Medicina do Minas Gerais, que assim coloca:

“Ao médico do trabalho, no exercício de suas atividades dentro do âmbito da empresa, é facultada a possibilidade de discordar de atestado médico apresentado pelo trabalhador, assim como estabelecer novo período de afastamento decorrente de sua avaliação médica, sempre assumindo a responsabilidade pelos seus atos.”

O serviço médico da empresa deve aceitar um atestado emitido por um profissional que não seja, nem médico, nem odontólogo? Fornecemos a resposta dessa pergunta num outro texto desse blog, link: http://bit.ly/qQX66w

  Uma empresa pode exigir que os atestados trazidos por seus empregados venham com a descrição do CID (Classificação Internacional de Doenças)? Não há previsão legal para essa solicitação. Ainda assim, muitas empresas condicionam a aceitabilidade dos atestados entregues por seus funcionários, com a necessária descrição do CID nesses documentos. Essa prática – que qualificamos como ilegal, por ferir a intimidade dos trabalhadores – repercute na mesa de muitos consultórios médicos. Nesse contexto, qual deve ser a conduta do médico assistente quando souber que a empresa, onde trabalha o seu paciente, exige a colocação do CID no atestado?

Assim coloca a Resolução n. 1.658/2002 do Conselho Federal de Medicina:

“Art. 3º Na elaboração do atestado médico, o médico assistente observará os seguintes procedimentos:

II — estabelecer o diagnóstico, quando expressamente autorizado pelo paciente.

Art. 5º Os médicos somente podem fornecer atestados com o diagnóstico codificado ou não quando por justa causa, exercício de dever legal, solicitação do próprio paciente ou de seu representante legal.

Parágrafo único. No caso da solicitação de colocação de diagnóstico, codificado ou não, ser feita pelo próprio paciente ou seu representante legal, esta concordância deverá estar expressa no atestado.”

Pelo que se extrai da normativa acima, a questão a ser resolvida pelo médico assistente que fornecerá o atestado é, sobretudo, com o paciente, e não com a empresa. Sabedor de que a ausência do CID no atestado poderá gerar desconto em seu salário, o próprio empregado, em regra, concorda com a colocação do CID nesse documento. Assim, cabe ao médico assistente lembrá-lo de que essa concordância deverá estar expressa (escrita) no próprio atestado, conforme se aduz da própria Resolução do CFM supracitada.

Alguns dirão: “essa empresa deveria ser denunciada por exigir que os empregados abram sua intimidade dessa forma”. Concordamos. No entanto, repousamos nosso entendimento no sentido de que o cuidado do médico assistente deva ser, sobretudo, com o paciente. Se o paciente autorizar expressamente, o CID será colocado. Caso não autorize, o CID não será colocado. Pronto. O que passar disso, na nossa opinião, deve ser resolvido entre os empregados (ou seus sindicatos), a empresa, o Ministério do Trabalho, etc.

Alguns também dirão: “dessa forma o médico estará coagindo o paciente a colocar o CID no atestado”. Respeitosamente, ousamos discordar dos que assim pensam. A pergunta ao paciente é clara e única: “você autoriza colocar o CID — o código de sua doença — no atestado que lhe será fornecido?” Caso ele negue, o assunto se encerra, e o CID não será colocado. Não há coação nenhuma da parte do médico.

Alguns ainda sustentarão: “é lógico que o paciente vai querer colocar o CID, até porque, caso não o faça, terá o salário descontado”. Concordamos (pela prática) que a maioria opta pela colocação do CID no atestado, quando se depara com tal circunstância. Mas ratificamos: os motivos que levaram o paciente a concordar com a colocação expressa do CID no atestado não dizem respeito ao médico. Se houve algum tipo de coação, esta foi feita pela empresa, instituição pela qual o médico não pode (e nem conseguiria) se responsabilizar.

Com todo respeito às opiniões divergentes, esse é o meu raciocínio.

Um forte abraço a todos!

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha

terça-feira, 20 de setembro de 2011

"ENGRAVIDEI NO PERÍODO DE EXPERIÊNCIA: TENHO DIREITOS?”

Prezados leitores.

O Portal UOL publicou hoje um texto de minha autoria com o seguinte título: “Engravidei no contrato de experiência, e agora?”


Aos engraçadinhos e engraçadinhas que estão me enviando mensagens perguntando "Dr. Marcos, quem é o pai da criança?", ratifico que o texto não não é autobiográfico!!!

Brincadeiras à parte, o texto é sério e merece ser lido.

Um forte abraço a todos e até quinta-feira (22/09), data provável para postagem de um novo texto nesse blog.

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha

sábado, 17 de setembro de 2011

ATESTADO DE MÉDICO DA EMPRESA PREVALECE SOBRE ATESTADO DE MÉDICO ASSISTENTE

Vídeo-aula sobre esse texto:



Prezados leitores.

Já são vários os textos desse blog nos quais falo sobre a soberania legal da decisão do Médico Perito do INSS com relação à decisão do Médico do Trabalho / "Médico Examinador". Elenco aqui alguns links para tais textos (e recomendo a leitura):

Essa soberania decorre de várias normativas (bem explicitadas nos referidos textos). Entre elas, cito aqui o enunciado da Lei 605 / 1949, Art. 6o, parágrafo 2o:

“A doença será comprovada mediante atestado de médico da instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado, e, na falta deste e sucessivamente, de médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria; de médico da empresa ou por ela designado; de médico a serviço de representação federal, estadual ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública; ou não existindo estes, na localidade em que trabalhar, de médico de sua escolha.”

Interpretando:

>> por lei (Lei 605 / 1949), somente médicos podem emitir atestados para fins de abonos de faltas trabalhistas (no Direito Privado ou para funcionários públicos regidos pela CLT*).

* Pois a Lei 605/49 tem direcionamento para os empregados, ou seja, trabalhadores do serviço privado ou regidos pela CLT. Já o serviço público, em regra, tem regras estatutárias/contratuais próprias.

>> Pela a análise da lei acima, percebemos também uma clara hierarquia entre os atestados médicos para fins de abonos de faltas ao trabalho. A palavra “sucessivamente” não deixa margem a nenhuma dúvida quanto a isso. Conforme essa hierarquia, assim são valorados os atestados médicos:

>> 1o lugar: atestado de médico da instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado;

>> 2o lugar: atestado de médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria;

>> 3o lugar: atestado de médico da empresa (Médico do Trabalho) ou por ela designado (incluindo aqui a figura do "Médico Examinador", nos termos do item 7.3.2 da Norma Regulamentadora n. 7 do Ministério do Trabalho e Emprego);

>> 4o lugar: atestado de médico a serviço de representação federal, estadual ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública;

>> 5o lugar (e último): qualquer outro médico que o trabalhador escolher (Médico Assistente).

Obs.: sobre emissão de atestados por profissionais não médicos, recomendo a leitura do texto que pode ser acessado pelo link: http://bit.ly/nfAvUi

Verificamos pela redação da Lei 605/49 que a decisão do Médico Perito do INSS (1o lugar na hierarquia) prevalece sobre a decisão do Médico do Trabalho / "Médico Examinador" (3o lugar na hierarquia).

De maneira análoga, observamos que a decisão do Médico do Trabalho / "Médico Examinador" (3o lugar na hierarquia), prevalece sobre a decisão do Médico Assistente do paciente (5o lugar – e último – na hierarquia legal).

Esse também é o entendimento do TST (Tribunal Superior do Trabalho). Transcrevo abaixo, matéria divulgada no site do TST (www.tst.jus,br), dia 14/09/2011, que ratifica tal posicionamento. O título da matéria é: "TST nega abono de faltas atestadas por médico que não pertence à empresa".

“A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho teve que decidir uma disputa envolvendo empregado e empregador relativa à não concessão de abono de faltas ao trabalho, cujo valor total pleiteado não chega a R$ 300. De um lado, o trabalhador pretendia o pagamento de 20 dias em que esteve afastado por motivos de doença; de outro, a empresa, que alegava não ter abonado os dias porque o atestado médico apresentado pelo empregado comprovando incapacidade para o trabalho não foi fornecido por médico de seu ambulatório. Para a Turma, a empresa estava com a razão: segundo a jurisprudência do TST, se a empresa tem ambulatório médico, compete a ela abonar as faltas por motivo de doença.

A disputa judicial teve início em 2010. O fiandeiro (profissional que trabalha com a fiação) da Fábrica de Tecidos Carlos Renaux S.A., em Brusque (SC), disse que procurou o ambulatório da empresa no dia 9 de abril de 2010 com dores lombares e foi orientado pelo médico a procurar um especialista em problemas de coluna. O médico da empresa lhe concedeu apenas um dia de licença, mas o trabalhador ficou outros cinco sem comparecer ao trabalho e não apresentou atestado relativo a esse período.

A empresa, em sua defesa, alegou o que o empregado já havia ficado 67 dias sem trabalhar e foi encaminhado ao INSS, que recusou concessão do benefício previdenciário (auxílio-doença) por constatar que os problemas de saúde alegados não eram incapacitantes para o trabalho. Por esse motivo, além de não pagar os cinco dias não atestados, negou também o pagamento dos dias não concedidos pelo INSS, em julho de 2009. Os afastamentos do fiandeiro relatam problemas como unha encravada, dor no pescoço e dores lombares.

A Vara do Trabalho de Brusque julgou improcedente a ação movida pelo trabalhador. Segundo o juiz, a existência de serviço médico na empresa não impede que o empregado procure outros profissionais, porém, neste caso, o abono das faltas por períodos inferiores a 15 dias é direito exclusivo da empresa. “O que existe é que os médicos que atendem nas empresas costumam ser comedidos e dificilmente concedem ausências justificadas, salvo se comprovada a real impossibilidade do trabalho, ao passo que os médicos não vinculados são bastante maleáveis e concedem licenças até mesmo sem a realização de exames mais profundos”, destacou o magistrado na sentença.

O empregado recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC), que deu parcial provimento ao seu pedido, concedendo os 15 dias de atestado e negando os cinco sem a autorização médica. Para o colegiado regional, a empresa não esclareceu a razão pela qual o atestado, emitido por outro médico, careceria de validade. “Parece-me não ter o serviço médico da empresa o poder discricionário de aceitar os atestados que quiser e recusar os demais. A norma não fala que cabe ao serviço médico do empregador, exclusivamente, examinar o empregado”. A empresa recorreu, então, ao TST.

Ao analisar o recurso de revista da fábrica de tecidos, o relator, ministro Renato de Lacerda Paiva, entendeu que o TRT, ao dar validade ao atestado subscrito por médico, independentemente de sua vinculação ao empregador, sem observar a ordem preferencial dos atestados médicos nem a competência primária do serviço médico da empresa para abonar as faltas, contrariou as Súmulas nº 15 e 282 do TST.

As jurisprudências pacíficas do TST, expressas nas mencionadas súmulas, estabelecem, respectivamente, que “a justificação da ausência do empregado motivada por doença, para a percepção do salário-enfermidade e da remuneração do repouso semanal, deve observar a ordem preferencial dos atestados médicos estabelecida em lei”, e que “ao serviço médico da empresa ou ao mantido por esta última mediante convênio compete abonar os primeiros quinze dias de ausência ao trabalho”. O recurso da empresa foi conhecido, para restabelecer a sentença que considerou improcedentes os pedidos do trabalhador.”

Link direto para essa matéria via site do TST: http://bit.ly/ppezAr

Um forte abraço a todos e até a próxima quinta-feira (22/09), data provável para postagem de um novo texto nesse blog.

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
Twitter: @marcoshmendanha