Eis uma
questão intrigante. Vejamos o que nos traz a Lei n. 11.907/2009, em seu art.
30, § 3º:
“Compete privativamente aos ocupantes do
cargo de Perito Médico Previdenciário ou de Perito Médico da Previdência
Social..., em especial a: (I) emissão de parecer conclusivo quanto à capacidade
laboral para fins previdenciários.”
Pelo
exposto, concluímos que, nas vias administrativas, é o Perito Médico do INSS
quem define se o já segurado receberá (ou não) algum benefício previdenciário,
e também a quantidade de dias de afastamento decorrente desse eventual
benefício.
Sendo
assim, deveria (ou não) Médico Assistente/Médico do Trabalho/”Médico
Examinador” solicitar a quantidade de dias de afastamento do trabalho, quando
do encaminhamento de seu paciente para perícia previdenciária? Já que será o Perito
Médico do INSS quem definirá o lapso temporal de afastamento, não seria melhor
que o Médico Assistente/Médico do Trabalho/”Médico Examinador” omitisse essa
solicitação, e deixasse a decisão integralmente sob responsabilidade do Perito
Médico do INSS? Sobre o assunto, já se posicionou o Conselho Federal de
Medicina (CFM), por meio do art. 3º, parágrafo único, inciso IV, da Resolução n.
1.658/2002, que assim nos traz:
“Quando o atestado for solicitado pelo
paciente ou seu representante legal para fins de perícia médica deverá observar: o provável tempo de repouso estimado
necessário para a sua recuperação, que complementará o parecer
fundamentado do médico perito, a quem cabe legalmente a decisão do benefício
previdenciário, tais como: aposentadoria, invalidez definitiva, readaptação.”
Assim,
enquanto essa normativa do CFM estiver em vigor, dúvidas não restam de que o Médico Assistente/Médico do Trabalho/”Médico
Examinador” deverá sim
estipular o provável tempo de repouso necessário para afastamento laboral e
recuperação de seu paciente, ao encaminhá-lo para o serviço previdenciário de
perícias médicas. No entanto, muitos médicos peritos do INSS questionam a necessidade dessa resolução do CFM.
Para alguns, ao indicar o lapso de tempo no encaminhamento para a perícia
previdenciária, o Médico
Assistente/Médico do Trabalho/”Médico Examinador” estaria induzindo o
segurado a acreditar que certamente receberia os dias ali propostos, e que,
quando isso não ocorresse, esse mesmo segurado poderia reagir até mesmo com
atos de violência (como infelizmente muito temos visto). Classificamos como
compreensível a opinião dos peritos do
INSS que assim advogam.
Todavia,
entendemos que, enquanto a Resolução do CFM n. 1.658/2002 estiver em vigor e
tiver de ser observada, ao encaminhar um paciente para o serviço de perícias
médicas da previdência, o mais importante é que seja dada ampla orientação a
esse segurado pelo Médico Assistente/Médico
do Trabalho/”Médico Examinador”. Ao
estipular expressamente o tempo de repouso (ou não), deverá informar claramente
ao segurado que o Perito Médico do INSS poderá ter raciocínio divergente, e
que, nesse conflito, a decisão do Perito Médico do INSS prevalecerá, por força
da Lei n. 11.907/2009. Exploramos vastamente esse tema no tópico 1.1 deste
livro (“O limbo trabalhista-previdenciário. Controvérsias entre Médico
do Trabalho e Médico Perito do INSS: a quem seguir?”).
A Lei n.
605/1949, art. 6º, § 2º, confirma a
soberania de decisão do Perito Médico do INSS frente a decisão de outros médicos,
e assim coloca: “A doença será comprovada mediante atestado de médico da
instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado, e, na
falta deste e sucessivamente, de
médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria; de médico da empresa ou
por ela designado; de médico a serviço de representação federal, estadual ou
municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública; ou não
existindo estes, na localidade em que trabalhar, de médico de sua escolha”.
Na mesma
linha, vem a Súmula n. 15 do Tribunal Superior do Trabalho:
“A justificação da ausência do empregado
motivada por doença, para a percepção do salário-enfermidade e da remuneração
do repouso semanal, deve observar a ordem
preferencial dos atestados médicos, estabelecida em lei.”
Percebemos
que a Lei n. 605/1949 deixa clara a hierarquia existente entre os atestados
médicos (sobretudo pelo uso da palavra “sucessivamente”). Nessa hierarquia, o
atestado de médico da instituição da previdência social prevalece sobre todos os outros. Isso implica dizer
que a decisão documentada do Perito
Médico do INSS (que tem valor de atestado médico) deve ser acatada, por
força legal, pelos outros médicos citados no texto (o que não significa que
essa decisão não possa ser questionada pelas vias cabíveis: administrativas e
judiciais). Aqui, não estamos tratando de uma afronta à autonomia dos outros
médicos por parte dos Peritos Médicos
do INSS. Também não nos cabe a discussão quanto a quem é mais
especialista no assunto, se Médico
Assistente/Médico do Trabalho/”Médico Examinador”, ou Perito Médico do INSS. Não! O que
verificamos aqui é apenas de uma imposição legal (como é o pagamento do imposto
de renda: sempre objeto de discordâncias e discussões calorosas, mas de
cumprimento obrigatório por força da lei). Apenas isso. Simples assim.
Portanto,
além da orientação que sugerimos quando do encaminhamento de cada segurado à
perícia do INSS, o Médico Assistente/Médico do Trabalho/”Médico Examinador”
também deverá informá-lo de que, caso não haja obtenção do benefício pretendido
por indeferimento do Perito Médico do INSS, há possibilidades de uma “segunda
chance”, seja na instância administrativa (solicitando novamente o benefício,
fazendo o pedido reconsideração (PR), entrando com recurso, etc., dependendo de
cada caso) ou na jurídica (acionando o INSS por essa hipotética negativa
indevida do benefício pleiteado). Se o segurado e/ou o Médico Assistente/Médico
do Trabalho/”Médico Examinador” entenderem que houve algum equívoco na
avaliação do Perito Médico do INSS (o que é perfeitamente possível e natural
quando se trata de interesses diversos sendo julgados à luz das ciências
médicas), que sejam usadas então as citadas vias para obtenção do requerido
benefício previdenciário. Alguém já disse (e disse muito bem): “que briguem as
ideias, jamais os homens”. Diante de tantos caminhos possíveis para obtenção
dos benefícios previdenciários, a violência contra os Peritos Médicos do INSS é
uma barbárie injustificável, e que acaba por afrontar a dignidade de toda
classe médica.
Fonte: Livro “Medicina do Trabalho e Perícias Médicas –
Aspectos Práticos e Polêmicos”, Terceira Edição - 2013 / Editora LTr. Autor:
Marcos Henrique Mendanha.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Os comentários só serão publicados após prévia análise do moderador deste blog (obs.: comentários anônimos não serão publicados em nenhuma hipótese).